quinta-feira, 1 de janeiro de 2009
Retrospectiva 003 - A Invasão Filipina!
Ah, nada como o início de um novo ano, e nada como iniciá-lo fazendo uma retrospectiva. Porém, o nosso objetivo aqui não é relembrar o que aconteceu de bom ou ruim no Mundo Encantado dos Quadrinhos em 2008. E devemos também acrescentar que apesar do título sugerir o contrário não iremos falar aqui de alguma saga mirabolante e "fantabulosa" da DC Comics ou da Marvel. Na verdade, falaremos de artistas oriundos da República das Filipinas - um arquipélago localizado no meio do Oceano Pacífico – que a partir do começo dos anos setenta passaram a trabalhar para o mercado americano de quadrinhos. E, diga-se de passagem: que artistas talentosos eles eram!
As Filipinas sempre foram um país multicultural, composto pela mistura do colonizador espanhol com os povos polinésios que a centenas de anos habitavam as ilhas. Em meio a esse cadinho cultural surgiu uma cultura relacionada a Nona Arte exuberante, com diversos gibis sobre os mais diversos temas sendo disponibilizados para um público ávido por quadrinhos, que por lá são chamados de Komiks. Não demorou muito para uma ou outra obra filipina chegar até os EUA, e qualidade desses trabalhos foi o suficiente para no início dos anos setenta motivar os editores Carmine Infatino e Joe Orlando a viajar até o arquipélago com o propósito de recrutar talentos locais para trabalhar na DC Comics.
Nos dias de hoje com a internet de banda larga qualquer desenhista morando no Nepal pode trabalhar para qualquer editora localizada em qualquer lugar do mundo. Todavia, nos anos setenta a coisas não eram bem assim,e praticamente todos os artistas recrutados por Infantino e Orlando acabaram se mudando para os EUA. Ao chegarem por lá boa parte deles começou trabalhando para a DC Comics, só que não demorou muito para eles expandirem seu raio de atuação para outras editoras, como a Warren e a Marvel Comics. Infelizmente nenhum deles atingiu o status de "super-astro" e isso se deve ao fato de que a grande maioria dos editores americanos não acreditavam que o estilo artístico dos filipinos era "adequado" para os típicos gibis de super-heróis, o que os obrigava a trabalharem quase sempre com revistas relacionadas com os gêneros de Terror ou Fantasia ou então como arte-finalistas para desenhistas americanos. Puro preconceito ou falta de visão desses editores, diga-se de passagem. Dito isso,iremos aqui relacionar alguns desses artistas que migraram dos Komiks filipinos para os comics americanos, e acreditamos que pelo menos o fãs mais "velhinhos" irão lembrar de alguns deles.
Os artistas filipinos sempre tiveram facilidade para trabalhar com histórias de Fantasia ou Terror, e um deles que decididamente conjugava a perfeição essas qualidades era Sonny Trinidad, que era um dos artistas favoritos de John Romita Sr., o editor de arte da Marvel nos anos setenta. Durante a sua carreira filipina ele usava o nome Celso Trinidad, e no arquipélago ele criou o super-herói El Gato, em parceria com o escritor Mike Tan. Para o mercado americano Trinidad trabalhou nos gibis Dracula Lives!, Marvel Chillers, The Son of Satan, Deadly Hands of Kung Fu, Skull the Slayer e The Savage Sword of Conan.
Nos anos cinqüenta ele estudava Medicina na Universidade de Manilla (capital das Filipinas), só que o amor pelos quadrinhos falou mais alto, e ele largou tudo para iniciar uma promissora carreira nos Komiks filipinos. Ao chegar nos EUA trabalhou na linha de gibis de Terror da DC Comics. Após passar um bom tempo na DC Comics Niño fez alguns trabalhos para Marvel, adaptando clássicos da ficção científica como o Homem Invisível e a Máquina do Tempo para o formato quadrinístico e posteriormente levou seu talento para a Warren Publishing e Heavy Metal. Outro vertente do seu trabalho foi o desenvolvimento de ilustrações e storyboards para produções televisivas estadunidenses, e recentemente a Image Comics prometeu que Niño será o ilustrador da minissérie Dead Ahead, que será lançada em 2009.
Um auto-didata que aprendeu por conta própria tudo que sabe, assim que migrou para os EUA em 1976 ele fez diversos trabalhos em títulos menores da DC Comics, até se firmar como um dos arte-finalistas mais requisitados da editora. Com certeza o seu trabalho mais conhecido é a arte-final feita para o lápis de George Perez no clássico gibi New Teen Titans (Novos Titãs). Hoje Tanghal tenta emplacar trabalhos mais autorais no mercado filipino de quadrinhos.
Durante um bom tempo esse talentoso artista filipino foi obrigado a assinar seus trabalhos com o sobrenome "Chua", devido a um erro de grafia ocorrido durante a sua imigração para os EUA. Isso não o impediu de se transformar em um dos mais destacados artistas do mercado americano, arte-finalizando diversos gibis tanto para a Marvel quanto para a DC Comics e se tornando um dos mais importantes desenhistas que trabalharam com as HQ’s do Conan,o Bárbaro. Após passar um bom tempo trabalhando com animação e design gráfico Chan aposentou-se, e nos dias de hoje eventualmente ele atende solicitações de fãs elaborando refinadas artes comissionadas para eles.
O primeiro artista filipino contratado por Infantino e Orlando para trabalhar na DC Comics. Por lá DeZuniga foi co-criador do deformado cowboy Jonah Hex e da super-heroína Orquídea Negra. Como praticamente todos os seus conterrâneos DeZuniga fez de tudo um pouco tanto para a DC quanto para a Marvel, até arrumar um emprego fixo na Sega e tornar-se um renomado designer de vídeo-game. Aposentado, hoje ele atua como professor de artes e eventualmente se dispõe a elaborar artes comissionadas para os seus fãs.
Desde o início da sua carreira nas Filipinas Redondo especializou-se em quadrinhos cristãos, e assim que começou a trabalhar a nos EUA ele deu continuidade a essa especialidade, se tornando um dos mais destacados artistas do gênero. Isso não significa que seu talento ficou restrito apenas aos quadrinhos cristãos: Redondo deu duro trabalhando para a Marvel e DC Comics em diversos gibis de Guerra, Terror e Fantasia, e provavelmente o seu trabalho mais famoso seja Rima, A Rainha das Selvas, uma belíssima adaptação de um romance inglês vitoriano sobre uma garota que se criou sozinha na selva amazônica. Após passar um bom tempo trabalhando com animação e dando aulas de arte Redondo nos deixou para sempre em 1996.
Considero um mestre na anatomia humana, a carreira de Nebres seguiu rumos semelhantes a de seus conterrâneos que trabalharam nos EUA. Entre um trabalho aqui e outro acolá para a Marvel e a DC Comics Nebres também desenvolveu projetos na Continuity (editora pertecente a Neal Adams) e na área de animação.
Ok, preciso fazer uma confissão: entre todos os artistas relacionados até o momento Alfredo Alcala é o favorito deste blogueiro que vos fala! E, além de ser o favorito do blogueiro decididamente é o artista filipino que possui a carreira mais cheia de "causos" pitorescos. Nascido em 1925, segundo o próprio Alcala durante a Segunda Guerra Mundial ele ajudou as Forças Aliadas durante a ocupação japonesa nas Filipinas desenhando mapas e esboços das bases nipônicas na ilha. Após o fim do conflito ele iniciou sua carreira nos Komiks filipinos e rapidamente se tornou um astro local, chegando a ganhar um gibi integralmente dedicado a ele, batizado com o título Alcala Komix Magazine. Dizem as "lendas" que durante a busca por talentos filipinos empreendida por Infantino e Orlando os dois editores perguntaram a Alcala quantas páginas ele conseguiria produzir por semana. Na bucha, o desenhista respondeu: "consigo produzir quarenta páginas por semana". Ora, Infantino e Orlando não botaram muita fé nessa declaração de Alcala, já que média de produção de um artista americano muito esforçado era dez páginas por semana, mas assim que ele começou a trabalhar nos gibis da DC eles perceberam que a produção dele era realmente assombrosa, e não somente em quantidade, mas também em qualidade. Rapidamente Alcala atingiu um certo destaque, e com certeza o trabalho mais conhecido do artista filipino aqui no Brasil seja a arte-final para o lápis de John Buscema nas aventuras de Conan publicadas na revista A Espada Selvagem de Conan. Aliás, sobre esse trabalho vale a pena comentarmos aqui que o genial Buscema até admirava Alcala, mas não gostava muito de trabalhar com ele: o estilo artístico do filipino era tão marcante que praticamente "desaparecia" com a arte de Buscema na histórias em que ambos trabalhavam juntos! Apesar do destaque alcançado nos EUA Alcala ficava um tanto quanto frustrado por ser geralmente contratado apenas como arte-finalista, todavia como bom profissional que era o filipino fazia qualquer trabalho com toda a dedicação possível, o que o tornou um dos mais prestigiados artistas dessa técnica no mercado americano. Infelizmente, em 2000 o câncer levou-o para para outras paragens.
Bem, quase todo mundo que foi citado aqui nesse momento curte a vida de aposentado ou então abandonou para sempre o nosso convívio, todavia as Filipinas ainda fornecem artistas para o mercado americano, tanto que desenhistas como Whilce Portacio, Leinil Francis Yu, Lan Medina, Francis Manapul e Philip Tan ainda levam para os comics americanos todo o talento e brilhantismo inerente aos komiks filipinos. E tenho dito! Ah, caso queiram saber mais sobre os artistas citados, acessem os links abaixo:
Links:
The Philippine Comics Art Museum
Blog do Romeo Tanghal
The Art of Tony DeZuniga - Site Oficial
Rudy Nebres - Site Oficial
Ernie Chan - Site Oficial
Nestor Redondo - Site Oficial
Belíssimo texto de Mark Evanier sobre Alfredo Alcala
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Um comentário:
Camarada vc esta de parabens,pena que nao tinha fotos dos desenhistas citados,afinal como super fa da Espada Selvagem do Conan eu sempre tive curiosidade sobre seus desenhistas e foi otimo saber que muitos nao eram americanos e o preconceito é uma merda.As ESC com a dupla Alcala e Buscema sao as joias do meu acervo.Parabens mesmo!!!!!
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